quinta-feira, 15 de março de 2012

"Música cristã tem mais a ver com ministério do que com mercado" - Confira nossa entrevista com Alma e Lua


1) ARTEDECHOCAR: Primeiramente queria que se apresentassem falando um pouco do encontro com Deus na vida de vocês, e o que fazem (além da música) no cotidiano de uma forma geral.


ALMA E LUA: Com certeza, Deus tinha algo preparado pra nós há muito tempo; nos conhecemos em 1976 e vivemos, por dois anos, uma amizade intensa que se transformou em namoro, noivado e casamento. Namoramos e noivamos onze anos e estamos casados há vinte e dois. É verdade que Deus dava sinais de sua presença em nossas vidas desde muito cedo, mas foi em 1987 que se revelou a nós, na época em que estávamos muito envolvidos com o início da carreira musical. Diante das enormes dificuldades, que são comuns a todos que sonham com a profissão artística, nos voltamos para as questões religiosas na esperança de obter aquela ajudazinha sobrenatural, como geralmente acontece com a maioria das pessoas; começamos a estudar a Bíblia e fomos surpreendidos pela Irresistível Graça de Deus, e enquanto progredíamos na carreira, Deus nos fazia progredir também em seus propósitos. Em 1991 nos convertemos e passamos a congregar em uma pequena comunidade neopentecostal de nossa cidade;  iniciou-se o processo de ruptura com os antigos projetos até que, em dezembro de 1995, o ministério absorveu a nossa carreira. No início de 1996 passamos a frequentar a Primeira Igreja Presbiteriana de Casa Branca, da qual somos membros, e com o apoio do pastor Sérgio Paulo Martins Nascimento desenvolvemos o ministério.  

Há quase nove anos eu, Paulinho, trabalho em Campinas, na LPC Comunicações - uma produtora que tem parceria com a Igreja Presbiteriana do Brasil e o Back to God Ministries International, o departamento de mídia da Igreja Cristã Reformada da América do Norte; a Rah cuida das nossas questões pessoais e da parte financeira do ministério, já que fica em Casa Branca durante a semana enquanto eu estou em Campinas. 



2) ARTEDECHOCAR: Com uma relevante caminhada musical, que lições podemos aprender com vocês no que tange a carreira secular e vida ministerial? 



ALMA E LUA: Carreira musical é show business, porque as grandes companhias, as principais emissoras de rádio e televisão e os agentes controlam o mercado, e de arte mesmo sobra muito pouco; o artista, quando tem a simpatia desse sistema, se vê obrigado a cantar o que eles querem, do jeito que eles querem e pelo tempo que eles querem; quando não seguem as regras, sofrem retaliação. Quase tudo é uma grande mentira, e as coisas normalmente acontecem por troca de favores ou propinas - o tal do jabaculê. Somente alguns artistas, geralmente as estrelas da MPB, conseguem utilizar esses meios com alguma autonomia. No que diz respeito ao ministério, uma das questões mais delicadas é encontrar o ponto certo entre o servir e o sobreviver, principalmente quando ministério e profissão se confundem. É preciso investir muito tempo para compor, estudar a Palavra e manter a forma artística com ensaios, estudos, além das questões estruturais como manutenção de veículo, de instrumentos e demais detalhes. Já tentamos desenvolvê-lo sem tocar no assunto "dinheiro", mas tivemos sérios problemas financeiros. Devido a esses problemas é que aceitei, em 2003, o convite do Celsino Gama para trabalhar com produção musical na LPC. 



3) ARTEDECHOCAR: O que mudou substancialmente na vossa cosmovisão quanto a dicotomia secular/cristão? 



ALMA & LUA: Entendemos que as referências Bíblicas nos remetem a questões bem mais relevantes  do que aquelas que a mera religiosidade observa; quando a Palavra ordena separação do mundo, está se referindo ao modelo desse sistema, e não a simples hábitos; o propósito de Deus para nós é que andemos na contramão, longe das vantagens que a desonestidade e os negócios ilícitos nos oferecem. A Palavra está nos dizendo: “O modelo do sistema não serve pra vocês!” e: “Joguem fora seus planos, Deus tem novos planos pra vocês agora!” Assim, é mais fácil para a maioria dos que se dizem cristãos, vender a ideia de que fumar é pecado, por exemplo,  do que abandonar uma carreira profissional onde a transparência e a honestidade não podem conviver com os lucros. A regra destes é bastante simples: Se é bom pra mim, é de Deus, é benção; se não me agrada, é do diabo. Não concordamos com essa visão; entendemos que Deus nos submete a uma profunda mudança de carácter, não de hábitos, para que aprendamos a não utilizar as estratégias que o modelo secular sugere. É mudança de estilo de vida.



4) ARTEDECHOCAR: Vocês se consideram cantores gospel?



ALMA & LUA:  Nos consideramos artistas cristãos, e queremos dizer com isso que acreditamos que nosso papel na Obra é através da música, e que nossos interesses precisam sempre ser submetidos ao propósito de Deus.



5) ARTEDECHOCAR: Apesar do grande conhecimento no meio artístico-musical, vocês optaram por um caminho menos glamoroso em busca de cantar canções mais relevantes, rejeitando de certa forma, por assim dizer, o mero mercantilismo dentro do ministério. Como vocês avaliam a atual situação do mercado musical secular e o dito mercado gospel? Semelhanças e/ou diferenças.



ALMA E LUA: Se o assunto é mercado, o objetivo é vender; entendemos que um artista cristão que faz música direcionada à carteira do seu irmão está, no mínimo, equivocado - estão mais para lobos do que para ovelhas. Não vemos problema algum em um cristão ser um profissional da música secular, contanto que consiga ficar imune às tramoias do sistema;  mas música cristã tem mais a ver com ministério do que com mercado. É evidente que o dinheiro é necessário, mas os excessos, os holofotes, a paixão por fama e fortuna tiram as pessoas do foco, é motivação errada; quando se faz música cristã para vender, além de ter que se adequar à indústria cultural (o tal jugo desigual), é necessário agradar o público, e para agradá-lo, é necessário falar o que querem ouvir, não o que precisam ouvir, e Obra de Deus não é entretenimento, é missão. 



Quanto ao mercado secular, há muito tempo não acompanhamos as coisas de dentro,  mas é evidente que tanta manipulação e interesse econômico resultou em banalidade artística extremada. E quem sofre as piores consequências?...



6) ARTEDECHOCAR: Diante de tanta confusão teológica e crescimento denominacional, pode-se falar de uma igreja brasileira? Como analisar e/ou diagnosticar as vantagens e desvantagens desse crescimento numérico dos evangélicos no país?



ALMA E LUA: Para nós, Igreja é Igreja - o Povo de Deus; não nos engajamos em nenhum movimento de nacionalização cristã porque, pelo menos por ora, não compreendemos nenhuma utilidade nisso. Nosso objetivo é contribuir para que haja qualidade cristã na Igreja, vida com poder e relevância. A Mensagem é adequada para todos os escolhidos de Deus, não importando a nacionalidade. 

Vemos esse tal crescimento evangélico como prejudicial, pois não nos parece genuíno - é onda; são pessoas buscando, preferencialmente, bençãos temporais e resistindo às ideias que traduzem compromisso - que como já dissemos, tem a ver com mudança de planos, não de hábitos. O pior de tudo é que parece não ser apenas um problema nacional, e  prejudica a unidade da Igreja, já que há crescente divergência quanto às interpretações teológicas, algumas vezes por falta de preparo, outras, por mero interesse pessoal.  



7) ARTEDECHOCAR: O último trabalho de Alma e Lua, Vanilla Jukebox (2011) nos apresenta a autenticidade de sempre de vocês. Remete-nos a uma textura recheada de violões, vocais, que nos lembra o country, o rural, anos 70, letras intimistas abordando temas relacionados ao coração do homem, natureza, levando-nos a contemplação e reflexão. Queria que nos falasse mais sobre este disco de uma forma geral. Há alguma autocrítica? E claro, onde e como adquirir?



ALMA E LUA: O Vanilla é resultado de um projeto do Celsino Gama, ex-diretor da LPC Comunicações, que viabilizava nossos lançamentos. A ideia foi somar em um só álbum nossas principais canções que estavam espalhadas em três outros - o “Caras Pintadas” de 1997, o “Desperta, América!” de 1999, e o “Sobrenome: Vento” de 2001, facilitando tanto os investimentos na fabricação, quanto os custos na aquisição. Gostamos muito da ideia, pois havia alguns problemas técnicos nos três primeiros cds que nos incomodava: O “Caras Pintadas” estava tecnologicamente ultrapassado, era muito antigo; com o “Desperta, América!” inauguramos um estúdio próprio e o cd serviu de laboratório para encontrarmos a melhor forma de fazer o nosso som com custo reduzido; o “Sobrenome: Vento” foi o álbum que mais nos agradou, porque conseguimos atingir, em nosso próprio estúdio, um bom nível técnico, mas este acabou ficando muito sofisticado, e nos incomodava tocar ao vivo acompanhados somente ao violão - que é como nos apresentamos - e ver as pessoas levando pra casa um cd todo paramentado com bateria, guitarras, órgãos, pianos, percussão...



No Vanilla, eu, Paulinho, fiz tudo sozinho e busquei fazê-lo com  simplicidade para que se aproximasse ao máximo do som que fazemos ao vivo; foi lançado sem a parte gráfica para destacar o conteúdo, mas é provável que ganhe uma capa simples nas próximas edições. 

Contatos, informações e nossos lançamentos estão disponíveis no nosso site: www.almaelua.com.br



8) ARTEDECHOCAR: Queremos desde já agradecer o contato e dizer que a gentileza e atenção de vocês nos fizeram perceber que estamos em casa. Que Deus possa vos abençoe grandemente.



ALMA E LUA: Mano véio, nós é que agradecemos a oportunidade, pois se não é correto exagerar no marketing de ministérios, também é impossível desenvolvê-los sem nenhuma divulgação. Queremos parabenizá-lo por sua contribuição à Igreja através do ArtedeChocar, pois os artigos que encontramos aqui contribuem muito para o aprimoramento de ideias.



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Muito satisfeito com a entrevista e contato com este casal abençoado. Paulinho você é uma figura, gente de Deus. Abração mano!

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