O cristianismo brasileiro, embora sincero em muitas de suas manifestações, é extremamente intolerante com relação à cultura. Grosso modo, vive-se na igreja evangélica brasileira um dualismo acentuado nas relações entre “mundo” e “igreja”, de modo que tudo quanto é secular é tomado pelos crentes como coisa profana.
Quer seja nas roupas dos membros das igrejas pentecostais, quer seja na liturgia e na música dos crentes tradicionais, o fato é que no seu desejo de ser diferente do mundo, a igreja brasileira acabou por confundir exteriorismo com vida devocional interior.
A intolerância cultural pode ser vista por toda parte numa igreja que resiste em se contextualizar [1] para facilitar o acesso das pessoas à Cristo, à igreja e ao reino de Deus. Ela ignora que a contextualização tem um papel pedagógico na proclamação do evangelho, pois torna acessível a mensagem da salvação.
Para reverter este quadro, é preciso enfatizar o caráter encarnacional da missão de Jesus. Para relacionar-se conosco, nosso Salvador foi homem em todo aspecto da vida, exceto no pecado. Ele podia vir ao mundo cercado de anjos e numa carruagem de fogo, mas preferiu vestir-se de carne. Embora fosse Deus no sentido pleno da palavra, Jesus respeitou a nossa cultura e a assumiu, entendendo ser esta a melhor forma de comunicar o evangelho.
A igreja brasileira carece de reflexão cultural. Ela precisa entender que do mesmo modo como nem tudo que tem o selo “evangélico” é santo, também nem tudo que é secular é contrário a nossa fé.
Cristo, aquele que é infinitamente melhor que nós, assumiu a nossa cultura e lhe deu dignidade. E a igreja? Será que ela está disposta a assumir a cultura de modo a parecer-se com o mundo em todo sentido, exceto no pecado?
Como missionário conheço bem o impacto que este texto vai causar no coração de muitos crentes sinceros e devotos, porém habituados a dividir o espaço apenas com seus iguais. Contudo, penso que esta reflexão é indispensável a uma igreja que deseja ser missionária e alcançar os perdidos para Cristo.
Precisamos reinventar nossa liturgia e rever a práxis cristã, fazendo clara distinção entre pecado e cultura, pois a igreja que não encarna na cultura para compartilhar o evangelho, não compreendeu completa e perfeitamente sua missão.
“A igreja que impõe sua cultura aos demais, terá sérias dificuldades em comunicar o evangelho de Cristo em um mundo pós-moderno”.
Nota:
[1] A palavra contextualização foi usada pela primeira vez por um evangélico no congresso de em Lausanne (1974). Byang Kato, palestrante africano, discursou naquela ocasião sobre a necessidade de contextualizar o cristianismo à cultura africana sem deixar contaminar-se pelo sincretismo.
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Leonardo Gonçalves é missionário, e edita o Púlpito Cristão.
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